Maracanã

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sábado, 2 de outubro de 2010

Maysa - Ne me quitte pas traduzida



Domingo, 2 de Agosto de 2009



Paris em agosto... música e imaginação...



O verão se instala em Paris, a estação calorosa está no auge, casais caminham lado a lado, os sonhos sobrevivem, gerações de amantes se superam, crianças devoram sorvetes, gente idosa sorri observando a vida que passa. A cidade do romance anda frenética, coalhada de turistas extasiados com seus segredos e tradições. Música, pintura, arte, cultura em profusão, história re-contada, um mundo de cores através dos olhares renovados.


Paris encanta-se de predicados, pessoas passeiam por seus caminhos de grande atração, Paris enternece e estonteia...Faz calor, mas o coração se gela quando alguém lembra do passado recente, deixando que a saudade do que já viveu em Paris, lhe invada a alma em sessão de nostalgia.


Ele voltará a Paris, por muitas vezes, sabe disso. Questões profissionais o obrigam a visitar constantemente a capital francesa, além disso, seu laços com aquele lugar já fizeram parte do seu crescimento pessoal, derivando para a busca da sua maturidade.


Como esquecer a Paris que ele conheceu quase menino, em 1968? Um furor de jovens em ebulição, o mundo pegando fogo nas Barricadas que cercaram a Sorboni, ele assistindo a um espetáculo de cidadania, protesto e engajamento social, de uma geração que mudava o mundo, com gritos de ordem, rostos sem rugas, agilidade e correria, um quadro inesquecível, na sua memória, a guerra nas esquinas do tempo, ele aprendendo a entender aquele povo, com seu coração aos pulos, há décadas atrás.



Pois ali conheceu lados da vida que o fizeram sobreviver com garra, foi à luta, esteve clandestino, mas saiu disso com o casamento legal, tornou-se cidadão francês, construiu família, dissolveu-se naquela cultura, a exemplo de milhares de imigrantes, seu clamor interno era o de viver dias de felicidade e de descobertas, o que realmente aconteceu.


Acabou trabalhando no interior da França, onde criou filhos, acostumou-se à vida no campo, adaptou-se ao estilo de suas comidas, bebidas, músicas, programações de televisão, shows, teatro, cinema, os novos amigos, hábitos antes estranhos, desafios de vida a serem superados, e ainda, incrivelmente, o gosto pelo desconhecido com tantos segredos a serem desvendados.


Muitos anos o separam daquele jovem idealista sem experiência, agora ele se vê no limiar de um período em que enfrentará, depois da solidão do divórcio, do crescimento e debandada dos filhos que se foram para morar sozinhos ou casados, agora, lhe apareciam os desejos de voltar a Paris para repensar e recomeçar a vida.


Aquela cidade, mais do que qualquer outra no mundo, lhe proporcionava sentir outra vez o mesmo sentimento de que fora tomado ao chegar tão jovem, para enfrentar a vida.


Retornava a Paris, com a sapiência dos homens mais vividos, os cabelos embranqueceram, as pernas embora ágeis, já não precisavam correr atrás de empregos e estudos, o tempo o premiava com liberdade para sentar nos cafés, apreciar os passantes, relembrar excessivamente seus amores, suas investidas em idéias, profissões, trabalhos desenvolvidos, diálogos que teve com alguém versando sobre o futuro, o tal medo do amanhã.



Ele voltava agora, em agosto. Um lindo sol o recebia. O amor já não estava lá, mas, ele o pressentia, a cada movimento dos olhos. O cheiro do amor vivido ali o confundia com o próprio tempo. Preferiu imaginar que tudo estava certo até sentir uma terrível saudade do que passou. No Café de Flore, sentado em mesa de canto, o homem não chorou para que alguém percebesse, mas seu coração espremeu-se no peito enquanto acendia um cigarro, pedia um vinho tinto, brindava sozinho ao verão em Paris, e, ainda, com olhos molhados, ele sentia a presença dela, podia ouvir sua voz nos ecos do tempo, mas já não conseguia degustar o mesmo beijo que trocaram naquele lugar, quando a vida parecia um festival de primavera, o verão se anunciava, o outono não era bem vindo, e o inverno não devia chegar jamais.


Cida Torneros


RJ, 2 de agosto de 2009

Um comentário:

João Videira Santos disse...

Como muitas histórias esta ficção escreveu-se com a realidade do presente sonhada no passado...