Maracanã

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quarta-feira, 23 de abril de 2014

A filósofa e a jornalista na tv aberta na noite de terça-feira




Na noite de terça-feira,  o programa de entrevista, em tom de íntima conversa feminina,  reune duas mulheres inteligentes, bonitas, modernas, o ambiente é de alto astral, a televisão em canal aberto apresenta Marcia Peltier, a jornalista que recebe Viviane Mose, a filósofa.

Falam da vida, da inserção da filosofia no cotidiano, das reflexões que a busca da tal felicidade proporciona, do vazio de cada solidão humana, e, em momento algum, seus diálogos remetem ao tema recorrente do supérfluo anestesiante que inunda as transmissões dos outros canais da televisão aberta brasileira. Nada a perder para quem escolhe, democraticamente, parar diante do aparelho receptor e observar o ping pong de falas sorridentes.

A jornalista doce é loira, comportada, tem voz macia, indaga com segurança,  transmite experiência.  A filósofa é morena, cabelos cacheados negros, voz forte, declarações também contundentes,  a nivel pessoal, pois acaba de completar 50 anos e se diz muito feliz por isso, tem um filho de 10, diz que é bom saber que precisa da família,  do marido, do seu núcleo humano, como referência de vida. A entevistadora cutuca como pode e consegue extrair respostas que incluem "por que corrermos atrás de modelos de felicidade? Isso é muito chato. Não quero ser feliz o tempo todo, o bom é saber que há sempre um espaço em cada um de nós a ser preenchido".


A filosofia corre solta, há espontaneidade nas palavras de ambas, um papo cabeça com efeitos especiais que não incluem plumas, paetês,  botoxs, nem remetem a corpos sarados ou moda, sequer é necessário ou possível,  detectar o menor vestígio de culto ao consumismo exacerbado.

Viviane lembra que o século XX foi o período em que o ser humano achou que resolveria tudo com a tecnologia, a ciência,  que poderia administrar felicidade em pílulas,  etc.  Marcia aborda o fenômeno do isolamento que a internet parece condicionar a juventude no século XXI.

Um clima de "vamos discutir a relação humana entre a filosofia e a vida que levamos" invade o cenário sóbrio,  o espectador também se pergunta quem sou eu, justo num dia em que tudo pareceu desabar, tal o enxame de notícias brabas que nos bombardearam aqui e alhures. Sorte minha assistir a leveza aparente de uma entrevista profunda. Fechei bem, com chave de tesouro filosófico,  o meu dia extenuado.

Dentro de cada um, ainda ressoam as imagens do menino assassinado pela madrasta no Rio Grande do Sul, quiçá com a ajuda do pai, e, os ônibus incendiados na garagem de uma empresa de coletivos em São Paulo, ou, a tragédia do naufrágio com tantas mortes de jovens na Korea do Sul, e também, o fastio do balanço com números crescentes de acidentes em estradas no feriadão da Páscoa.

Mas, a salvação midiática da lavoura noticiosa chegou mesmo, para mim e outros tantos, quando pudemos assistir o oásis proporcionado pelas duas, a filósofa e a jornalista, que nos dessedentaram com a fonte refrescante do seu encontro humano.

Amém, recorri ao pensador Marshall McLuhan, que um dia escreveu " a televisão não é boa ou má,  é como a arma de fogo, depende do uso que se faz dela".

Maria Aparecida Torneros


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